Em declarações separadas, as duas empresas disseram que estavam “decepcionados” com a decisão. Apple e Google
Reuters/Mike Segar/Andrew Kelly
A justiça da União Europeia decidiu definitivamente, nesta terça-feira (10), contra os gigantes americanos da tecnologia Apple e Google em dois processos judiciais de longo prazo com grandes interesses financeiros em jogo, lançados pela Comissão Europeia.
Para especialista entrevistada pela RFI, a vitória é importante, mas está longe de ser uma revolução.
O Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE), de última instância, decidiu que a Apple deve reembolsar € 13 bilhões (R$ 80,59 bilhões) de impostos atrasados à Irlanda por ter se beneficiado de vantagens fiscais indevidas, equiparadas a um auxílio estatal ilegal.
Num acordo separado, o tribunal com sede no Luxemburgo confirmou uma multa de € 2,4 bilhões (R$ 14,88 bilhões) contra a Google por práticas anticoncorrenciais.
Os dois grupos disseram imediatamente que estavam “decepcionados” em declarações separadas.
O caso Apple remonta a 2016, quando Bruxelas ordenou ao fabricante do iPhone que reembolsasse a Irlanda € 13 bilhões. A soma corresponde aos lucros provenientes do tratamento fiscal favorável concedido à empresa entre 2003 e 2014, neste país para onde a Apple repatriou todos os seus rendimentos obtidos na Europa, bem como na África, no Oriente Médio e na Índia.
A comissária europeia da Concorrência, Margrethe Vestager, festejou a vitória durante uma coletiva de imprensa em Bruxelas.
Mas para Joelle Toledano, professora associada à Cátedra “Governança e Regulação” da Universidade Paris-Dauphine e membro da Academia de Tecnologias, é uma vitória, mas que chegou “muito lentamente”.
“Essas decisões foram tomadas pela Comissão Europeia em 2016 para a Apple e 2017 para Google, sobre fatos que aconteceram no começo deste século, ou antes. Não são histórias recentes”, diz.
Mas nem por isso deixam de ser positivas.
“Nos encontramos em um momento em que a União Europeia confirma o que é de bom senso, isso é, para a Apple, a Irlanda efetivamente deu condições interessantes para se instalar no país. Estamos no coração do que buscavam condenar, que eram as ajudas de Estado, ou seja, que os países não fizessem concorrência uns aos outros”, analisa. “É um resultado positivo, que tomou um certo tempo, mas que podemos aplaudir”.
“Claro que tudo isso faz pressão, mas ainda não temos mudanças revolucionárias”, insiste a especialista.
Irlanda, paraíso fiscal para Apple
Para a Comissão Europeia, a subsidiária irlandesa da Apple pagou uma taxa de imposto efetiva irrisória sobre os seus lucros europeus “variando entre 1% em 2003 e 0,005% em 2014”.
Mas, em 2020, em primeira instância, o Tribunal Geral da UE anulou a decisão do executivo europeu em 2020, uma bofetada retumbante infligida a Vestager. A Comissão entrou então com recurso no TJUE.
Uma nova reviravolta aconteceu em novembro de 2023. Com um parecer não vinculativo, mas geralmente seguido pelos juízes, o Conselheiro Geral Giovanni Pitruzzella questionou a vitória da Apple.
Ele propôs aos juízes que anulassem a sentença e remetessem o caso ao Tribunal Geral da UE “para que este possa decidir novamente sobre o mérito”.
O Tribunal, no entanto, não seguiu este parecer, mas decidiu definitivamente sobre o litígio e confirmou a decisão da Comissão Europeia de 2016, que a Irlanda concedeu à Apple ajuda ilegal que o Estado era obrigado a recuperar.
A Irlanda “respeitará” esta decisão, anunciou o governo em Dublin.
A Apple sempre afirmou que não recebeu nenhum tratamento preferencial.
“Nossa renda já estava sujeita a impostos nos Estados Unidos”, respondeu o grupo. “Este caso nunca foi sobre o montante dos impostos que pagamos, mas sim sobre a que governo somos obrigados a pagá-los. Pagamos sempre todos os impostos que devemos”, afirmou a empresa.
Caso Google
No caso Google, os juízes confirmaram uma multa de € 2,4 bilhões de euros aplicada em 2017 ao grupo Mountain View por abuso de posição dominante no mercado de pesquisas online. Esta é a segunda sanção financeira mais pesada já imposta pela UE num caso antitruste.
O Tribunal considera que a Google abusou da sua posição dominante ao favorecer seu próprio serviço de comparação de produtos.
“Estamos decepcionados com a decisão do Tribunal. Fizemos alterações em 2017 para cumprir a decisão da Comissão Europeia”, reagiu principal motor de busca do mundo.
O Google é acusado de ter favorecido a comparação de preços do Google Shopping, tornando seus concorrentes praticamente invisíveis para os consumidores. Ele foi forçado a modificar a exibição dos resultados de sua pesquisa para cumprir os requisitos europeus.
A gigante californiana apelou ao Tribunal da UE que decidiu a favor da Comissão, num primeiro acordo proferido em novembro de 2021. Mas o Google interpôs novo recurso, exigindo o cancelamento da multa.
O caso começou em 2010 com a abertura de uma investigação por parte de Bruxelas na sequência de denúncias de concorrentes.
Este é um dos grandes litígios abertos por Bruxelas contra a Google, que detém o recorde das duas maiores multas já aplicadas pelo executivo europeu por práticas anticoncorrênciais.
O valor de € 2,4 bilhões direcionado ao Google Shopping representou um valor recorde na época em que foi pronunciado. Foi superado em 2018 por outro de € 4,3 bilhões que sancionou um abuso de posição dominante do sistema operativo Android para celulares.
No total, a Google foi multada em mais de € 8 bilhões por diversas violações da concorrência.
O grupo também está na mira das autoridades reguladoras dos Estados Unidos. Desde segunda-feira (9), ele enfrenta seu segundo grande julgamento em menos de um ano contra o governo americano.