Golpistas observam, do Palácio do Planalto, atos de vandalismo no prédio do Supremo Tribunal Federal
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A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara abriu nesta terça-feira (10) a reunião que pode dar início à análise de uma proposta que perdoa as condenações criminais sofridas por vândalos envolvidos com os atos golpistas de 8 de janeiro de 2023.
O texto é uma das principais pautas de parlamentares de oposição ao governo na Casa, que se articularam ao longo de todo o dia para evitar um esvaziamento do colegiado e assegurar que o projeto tivesse uma largada antes do primeiro turno das eleições municipais.
Em uma semana com presença remota liberada no plenário, mas com exigência de registro físico de frequência nas comissões, levantamento do g1 apontou que o PL e PP promoveram 21 trocas de membros para garantir que a CCJ tivesse o número mínimo de deputados necessário para abrir a reunião (34 parlamentares) — a maior parte entre esta segunda (9) e terça.
A liderança do governo, por outro lado, orientou parlamentares da base a não registrar presença, em uma tentativa de frustrar o começo da discussão do chamado “PL da Anistia”.
Na reunião desta terça, a expectativa é que o relator do projeto, deputado Rodrigo Valadares (União-SE), faça a leitura de seu parecer, que deve sugerir um novo texto, reunindo sete projetos de teor semelhante que são discutidos na CCJ.
O relator tem um histórico público de participação em manifestações de apoio ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), defensor da anistia aos vândalos.
O objetivo central do texto de Valadares, segundo ele próprio, é perdoar os participantes dos atos golpistas de 8 de janeiro que foram presos ou que estão sendo investigados.
Os envolvidos nesses atos depredaram prédios do Congresso Nacional, do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Palácio do Planalto, em uma tentativa de desestabilizar a ordem democrática e questionar o resultado das eleições de 2022.
O Supremo já condenou 227 pessoas pela invasão e depredação das sedes dos Três Poderes. Ao todo, 1.644 pessoas já foram denunciadas pelo Ministério Público Federal.
Nos bastidores, a proposta de anistia tem sido avaliada por parlamentares aliados a Jair Bolsonaro, derrotado nas urnas em 2022, como um “moeda de troca” na disputa pela sucessão de Arthur Lira (PP-AL) ao comando da Câmara.
A intenção de fazer andar uma proposta de anistia aos vândalos ficou clara no último fim de semana, em um discurso do próprio ex-presidente Bolsonaro em São Paulo. “Anistia é um remédio político. O Congresso pode nos dar esse remédio político. Nós merecemos isso”, declarou.
Desde o último ano, parlamentares de oposição têm afirmado que podem condicionar o seu apoio ao comprometimento de um candidato com o eventual avanço do texto na Casa.
Para virar lei, a proposta precisaria ser aprovada pela CCJ. Mas, depois, teria de ser chancelada pelo plenário principal da Câmara dos Deputados — que tem a pauta escolhida pelo presidente da Casa. Na sequência, teria de ser submetida à análise do Senado. Por fim, se aprovada nas duas Casas, teria de ser sancionada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Especialistas em direito constitucional criticam o texto e apontam que, embora o Congresso tenha competência constitucional para conceder anistia, há um conflito em tentar perdoar crimes contra o Estado Democrático de Direito e uma tentativa de enfraquecer o Poder Judiciário.
Segundo o doutor em direito constitucional pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) Ademar Borges, a Câmara tem competência para aprovar uma lei de anistia, mas a anistia não pode incidir sobre esse tipo de crime.
“O STF decidiu que é inconstitucional a anistia dada às pessoas que cometem crimes contra o Estado Democrático de Direito. Sendo assim, o perdão para esse tipo de crime seria inconstitucional”, afirmou.
A avaliação é semelhante à do advogado criminalista André Perecmanis, também professor de direito na Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RJ).
“O Congresso se colocaria acima do Judiciário, outro precedente perigosíssimo. Anistia é um instrumento previsto na Constituição, mas a aplicação nesse caso é inconstitucional”, avaliou Perecmanis.
Para o professor de direito constitucional da Universidade Federal Fluminense (UFF), Gustavo Sampaio, há uma contradição na proposta ao estabelecer anistia para condenados que tentaram agir contra o próprio Congresso.
“Pelo inciso 44 interpretado literalmente, o Congresso pode até aprovar um PL de anistia, todavia é absolutamente contraditório imaginar que um projeto de lei conceda anistia a quem agiu contra a própria democracia, fundamento maior da separação de poderes”, disse.
O professor de direito constitucional da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) e da Fundação Getúlio Vargas (FGV), Wallace Corbo, segue a mesma linha: “O poder Legislativo para burlar a proteção à democracia está anistiando crimes contra a democracia”.