Criança de Uberlândia tem pedido de remédio de R$ 16 milhões negado e família luta para conseguir tratamento


Guilherme Antônio Rabelo de 12 anos é portador de Distrofia Muscular de Duchenne (DMD) e luta contra o tempo para conseguir medicação. A doença genética neuromuscular rara, causa fraqueza progressiva e perda de massa muscular. Guilherme Antônio Rabelo, DMD, duchenne
Acervo familiar/Reprodução
Natural de Uberlândia, no Triângulo Mineiro, Guilherme Antônio Rabelo, de 12 anos, é portador de Distrofia Muscular de Duchenne (DMD). Diagnosticado aos 8 anos, o filho de Elda e Leandro Rabelo, vive com a doença genética neuromuscular rara, que causa fraqueza progressiva e perda de massa muscular, afetando os movimentos do corpo, capacidade respiratória e cardíaca.
A expectativa para os portadores da doença é que vivam até os 22 anos, mas podem chegar a 30 ou 40 anos. O único medicamento capaz de mudar o prognóstico de Guilherme e desacelerar a progressão da doença se chama Elevidys, que foi aprovado recentemente para utilização excepcional no Brasil pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).
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Dois fatores, contudo, impedem que Guilherme receba o medicamento: a criança está fora da faixa etária autorizada para o uso da droga em solo nacional e, por isso, teve o pedido da medicação negado pela Justiça. Além disso, a família precisa arrecadar R$ 15 milhões necessários para a compra do remédio.
Uma campanha foi organizada pelos familiares para ajudar a criança.
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A doença
A DMD é uma doença genética rara que causa a degeneração progressiva dos músculos. Ela é causada por uma mutação no gene responsável pela produção da distrofina, uma proteína essencial para a integridade muscular.
“A falta da proteína impede o reparo da musculatura. Toda vez que o músculo contrai, é preciso que haja esse reparo. Se eu vou andar, por exemplo, eu necessito de contração muscular, o que gera um dano, que precisa da reparação. Com a falta de reparos, após muitos danos, ocorre a morte progressiva de todos os músculos do corpo”, explicou o neuropediatra Luís Fernando Grossklauss, que acompanha o caso de Guilherme.
Guilherme Rabelo, portador da distrofia muscular de Duchenne (DMD)
Acervo familiar/Reprodução
Ele explica, ainda, que a condição afeta principalmente meninos, já que está ligada ao cromossomo X, e costuma ser diagnosticada na infância, com sinais como fraqueza muscular, dificuldades para andar e atraso no desenvolvimento motor. Com o tempo, a perda de força atinge outros músculos, incluindo os respiratórios e cardíacos.
“Por volta dos 10 anos, a criança começa a apresentar dificuldade para andar. Aos 3 ou 4 anos já é possível notar certa dificuldade em levantar do chão ou subir escadas. Por volta dos 20 a 25 anos, pode surgir a necessidade de suporte respiratório. O óbito ocorre, em geral, devido à falência do coração ou dos músculos respiratórios, por volta dos 30, 40 anos.”
Segundo Luís Fernando, apesar do prognóstico difícil, o Elevidys é capaz de estabilizar a doença.
“Tudo o que fazemos hoje, seja com medicações, suporte ventilatório ou proteção cardíaca, é exclusivamente paliativo. Essas intervenções não interrompem a evolução da doença. Já o Elevidys, com base nos estudos disponíveis, demonstra ser capaz de parar essa progressão. Ou seja, se a criança ainda estiver andando, ela pode continuar andando”, disse.
“Considerando o curso natural da doença, em que uma criança por volta dos 10 anos para de andar e, aos 25, já estaria bastante debilitada, o Elevidys pode adicionar esses 15 anos de mobilidade.”
De acordo com o neuropediatra, se esse efeito realmente se mantiver por 15 anos, ou até mais, há grande diferença na vida do paciente.
Sem a intervenção, uma criança que dependeria de ventilação aos 20 anos dificilmente teria a oportunidade de cursar uma faculdade. Por outro lado, um homem de 30 anos ainda andando teria tido essa oportunidade, podendo estar inserido no mercado de trabalho e levando uma vida mais próxima da normalidade.
Elevidys, fabricado pela norte-americana Sarepta e importado no Brasil pela Roche
Sarepta/Divulgação
Negativa da Justiça
Segundo o PhD em Neurologia e coordenador do Grupo de Neurogenética da Universidade de Campinas (Unicamp), Marcondes França Junior, nos testes clínicos da medicação feitos com crianças de até 8 anos incompletos, a droga se mostrou realmente promissora.
“A aprovação que consta em bula, que a Anvisa deu, é de 4 a 8 anos incompletos, com base em um estudo principal que acompanhou crianças desta idade por cerca de um ano. [Com base nestes dados] o STF acabou restringindo a aprovação das liminares para este perfil de idade”, explicou.
Apesar disso, o especialista acredita que o Elevidys tenha efeitos para além desta idade.
“A gente não sabe exatamente como será a ação deste medicamento para além da idade dos testes clínicos. Mas, pela maneira como o medicamento se propõe a atuar, eu acredito, sim, que é possível que ele tenha um efeito além dos sete anos de idade.”
Segundo o especialista, o mesmo laboratório que desenvolveu o medicamento, o Sarepta, também tem outros estudos com crianças mais velhas. Esses estudos geraram dados que possibilitaram que a agência governamental dos Estados Unidos responsável por regular produtos para garantir a segurança e a saúde dos consumidores, a Food and Drug Administration (FDA), ampliasse o uso do medicamento para outras idades.
O advogado responsável pelo caso de Guilherme, Gabriel Massote, explica que quando assumiu o processo, a sentença já estava definida, com o pedido julgado improcedente.
“Mesmo após a decisão, o juiz que julgou o pedido improcedente pediu por uma perícia judicial para comprovar a necessidade do remédio. O perito nomeado pelo juiz concluiu que ele deveria tomar o medicamento e, ainda assim, o pedido foi negado”, afirmou o advogado.
Desde então, foram apresentados recursos ao Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (TJDFT) e ao Supremo Tribunal Federal (STF). No entanto, uma decisão liminar do ministro Nunes Marques também negou o pedido.
“O Gui não tem mais tempo. Ele atende a todos os critérios para receber o tratamento, conforme parâmetros já estabelecidos pelo STF para outras crianças na mesma situação”, conta Massote.
Guilherme Rabelo, portador da distrofia muscular de Duchenne (DMD)
Acervo familiar/Reprodução
Corrida contra o tempo
Mãe de Guilherme, Elda Rabelo lidera a campanha de doações nas redes sociais e diz que cada dia perdido é um dia a menos para salvar o filho.
“Estamos aflitos, mas não vamos nos render. É cruel pensar que existe um tratamento, uma chance, mas que burocracias e decisões nos impedem de alcançá-lo. Enquanto isso, a doença não espera”, afirmou.
“Precisamos de ajuda urgente, todos os dias perdemos um pouco dele. Foi negado o pedido de socorro para o meu filho. Agora temos que correr pra conseguir esse valor desumano.”
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