No aniversário de 45 anos da sigla, o presidente da fundação do partido Paulo Okamotto lamenta o fim do PSDB e defende enfrentamento a ‘modelo econômico nefasto’. O PT completou 45 anos nesta segunda-feira (10) com o desafio de se aproximar mais das dores da população brasileira e de fazer com que as classes populares encampem os valores sociais defendidos pela sigla.
A avaliação é do ex-operário e um dos fundadores do partido, Paulo Okamotto, que hoje preside a Fundação Perseu Abramo, instituição que se dedica à formação política de seus quadros e é uma espécie de bússola ideológica da legenda.
Paulo Okamotto, presidente da Fundação Perseu Abramo.
PT/Divulgação
“O partido tem que ter a clareza de que a luta não se dá somente no Parlamento. Às vezes, a gente fica muito resumido [à ideia] de que fazer política é ser vereador, deputado, prefeito e presidente da República”, afirma ele, em entrevista à GloboNews.
“Não é que nós não estamos vendo algumas reivindicações importantes do povão; o PT é um partido popular. Mas essa dor precisa chegar com mais força à cúpula do partido. O partido precisa verbalizar e quebrar a cabeça sobre como vai resolver isso”, segue ele, citando preocupações da sociedade como segurança, saúde e trabalho.
“Nós temos um ditado no partido: ‘A cabeça pensa onde os pés andam’. Se a gente só anda no Parlamento, nas assembleias e na Câmara, a gente, muitas vezes, não está vivendo a vida real do povo”, avalia Okamotto.
Integrantes do PT à época da fundação do partido, em 1980.
Divulgação/Fundação Perseu Abramo
Atenção às novas dinâmicas
O petista histórico afirma que as demandas da classe trabalhadora mudaram, e defende que a esquerda deve estar atenta às novas dinâmicas para disputar o protagonismo de discussões que envolvam o segmento.
“[O trabalhador hoje] é um cara que não vê saída no nosso sistema econômico. Ele é contra esse sistema, até mesmo o sistema democrático de eleição, porque fala: ‘Esse negócio não vai me possibilitar ter uma casa, comprar esse carro’. Ele fica, muitas vezes, com a saída fácil, que é falar que você tem que ser empreendedor. É ótimo ter empreendedores, mas precisamos pensar em qual é o limite disso”, afirma o dirigente.
Para Okamotto, a mensagem deve passar por um convencimento sobre a relevância da redistribuição de renda, e não o foco em iniciativas individuais.
“Nós precisamos dar mais luz a esse modelo econômico nefasto, que está concentrando cada vez mais renda. Nós temos que convencer a sociedade de que quem tem mais dinheiro tem que pagar mais as contas. Precisamos trabalhar duro para poder fazer isso, porque senão a saída fica [em torno de] ‘empreendedorismo’, ‘vamos jogar na bet’, ‘vamos ser influencer’. Isso não é uma saída coletiva.”
Proximidade de Lula
Apesar dos reveses enfrentados pelo PT na última década, que incluíram desde o impeachment de Dilma Rousseff à prisão de seu principal líder, Luiz Inácio Lula da Silva, o dirigente faz uma avaliação positiva da trajetória da sigla fundada em 1980.
Hélio Bicudo discursa em comício do Partido dos Trabalhadores (PT), que reuniu 70 mil pessoas em frente ao estádio do Pacaembu, em São Paulo, em novembro de 1982
Luiz Gevaerd/Estadão Conteúdo/Arquivo
“Se eu tirasse uma foto do PT hoje, a gente teria uma figura muito exitosa na vida. Não é uma coisa muito habitual um partido com um programa progressista, socialista, que luta contra a injustiça ter tido tanto sucesso quanto ele teve”, diz, citando as vitórias presidenciais desde 2002.
Conhecido por sua proximidade de Lula, o petista histórico rejeita a tese de que o presidente estaria sendo blindado por assessores mais próximos de críticas ao seu terceiro mandato.
“Isso aí é tudo folclore. Quem conhece o presidente sabe que o Lula é um cara que você pode falar o que você quiser para ele”, afirma.
“O pessoal lá da Presidência fala coisas para ele, os ministros que lá estão também falam. Ele é um cara que está antenado às coisas. O problema todo é que o Lula já foi presidente duas vezes, elegeu a Dilma e se elegeu de novo. Se alguém vai dar um palpite, não é que ele não deixa o cara falar, mas a pessoa já chega meio inibida.”
Fim do PSDB
O presidente da Fundação Perseu Abramo diz lamentar um possível fim do PSDB, sigla que disputou o poder com o PT após a redemocratização do país e está em tratativas para se fundir a outra agremiação. “O fim de um partido democrático como o PSDB é sempre meio triste”, afirma.
Ex-adversários nas eleições presidenciais de 1994 e 1998, Lula (PT) e o ex-presidente FHC (PSDB) se encontraram em 2024, em São Paulo.
Divulgação
Okamotto diz esperar que a eleição da próxima executiva nacional do partido, prevista para julho deste ano, seja uma oportunidade para o PT se aproximar mais das camadas populares.
“Se a gente tiver uma direção mais conectada ainda com a realidade e com as dificuldades do povo brasileiro, eu tenho certeza de que o partido, pelo jeito que ele funciona, vai dar a resposta e vai se legitimar cada vez mais perante o povo”, afirma.
“Falta animar o povo, [o PT] tem que encantar o povo de novo. Vamos ter que fazer um trabalho para o povo dizer: ‘Esse PT é porreta’”, diz Okamotto.