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Levantamento do g1 mostra que seis milhões de pessoas estiveram expostas a calor extremo por um período de até cinco meses em 2024, mas em todas as cidades do país houve pelo menos um dia nessas condições. Calor explica retrato de extremos com fogo, seca e dengue. Mais de 6 milhões de pessoas enfrentaram calor extremo no Brasil
O Brasil viveu sob extremos em 2024. Um levantamento exclusivo do g1 mostra que seis milhões de pessoas estiveram expostas a calor extremo no ano passado por um período de 150 dias. Mas o calor atingiu todo o país: todas as cidades brasileiras enfrentaram ao menos um dia com temperaturas máximas extremas.
🔴 O calor é uma consequência das mudanças climáticas, provocadas pela maior emissão de gases do efeito estufa. Com isso, o mundo inteiro está ficando mais quente, mas o que os especialistas alertam é que os países tropicais, já quentes, como o Brasil, serão os mais afetados.
E temperaturas extremas trazem consequências:
Impulsionam o fogo durante os períodos de crise de incêndio, como vimos acontecer em São Paulo, no Pantanal e no Norte.
Se transformam em combustível para a seca. O calor torna o solo ainda mais quente, intensificando o processo de evapotranspiração e fazendo desaparecer a pouca água existente.
Aceleram o ciclo biológico do mosquito da dengue, favorecendo a propagação da doença.
E foi justamente esse o cenário que vimos em 2024, um ano de extremos para o país. Todas as regiões foram afetadas pelas altas temperaturas, cada uma de forma diferente:
🔥 No Norte, a maior bacia do mundo viu os rios secarem;
🔥 No Nordeste, o calor aumentou a crise de acesso à água e gera clima de deserto;
🔥 No Centro-Oeste, a maior planície alagável do mundo esteve em chamas e cidades ficara meses sem chuva;
🔥 No Sudeste, São Paulo esteve em chamas e viu explodir os casos de dengue;
🔥 No Sul, o Rio Grande do Sul ficou embaixo d’água com chuva reforçada pelo calor nos oceanos.
➡️ O levantamento feito pelo g1 em parceria com o Centro Nacional de Monitoramento de Desastres (Cemaden) mostra que 111 cidades no país, em diferentes estados, passaram mais de 150 dias sob extremos de calor. Isso significa temperaturas que, muitas vezes, ultrapassaram os 40°C. (Veja abaixo a situação na sua cidade)
Abaixo, entenda como cada região foi afetada:
Maior bacia do mundo viu os rios secarem
O levantamento feito pelo g1 mostra que o Norte foi a região mais afetada pelo calor intenso, especialmente o Pará. O estado teve 46 das pouco mais de 100 cidades que enfrentaram calor extremo por mais de 150 dias.
➡️ Além disso, as cidades com o maior período de estresse térmico também estão no Pará: Melgaço e Belém, a capital. (Leia mais aqui sobre Melgaço)
A principal consequência na região foi a seca. O Norte é banhado pela bacia hidrográfica da Amazônia, a maior de água doce do planeta. Seus rios percorrem milhares de quilômetros e são fundamentais para a geração de energia, abastecimento, indústria e para milhões de pessoas na região.
Em 2024, a seca foi tão intensa que fez com que longos trechos dos principais rios da bacia desaparecessem. A principal causa foi o El Niño, fenômeno que aquece os oceanos e provoca estiagem na região Norte. No entanto, diferentemente de outros anos com o fenômeno, desta vez a seca foi mais extensa e duradoura do que o já visto antes.
Imagem mostra trecho de rio no Norte completamente seco
Edmar Barros/AP
➡️ O que especialistas apontam é que o calor pode ter sido o combustível para a crise. As altas temperaturas aceleraram a evaporação da água dos rios, levando-os a níveis mínimos históricos.
No Norte, o calor transformou o cenário dos rios em uma vastidão de terra, deixando comunidades inteiras sem água, sob temperaturas acima de 35°C.
As plantações não resistiram à seca e ao calor, deixando famílias sem sustento. Segundo levantamentos, o prejuízo financeiro para a região foi na casa de bilhões.
A estiagem intensa no Norte impacta o restante do país. Isso porque a Amazônia é um grande bolsão de umidade, responsável por distribuir vapor d’água para outras regiões. Quando falta umidade lá, a situação se agrava em todo o Brasil – e foi exatamente o que aconteceu.
Moradora pega água suja em açude durante forte seca no Piauí
Reprodução/TV Clube
Sem água na torneira
O Nordeste é conhecido por suas altas temperaturas, que ficaram ainda mais intensas. Em algumas cidades, a máxima chegou a 43°C.
Na região, uma das maiores preocupações é com a oferta de água. O Nordeste tem o maior número de pessoas sem acesso à água na torneira. Segundo os dados do último censo, são 1,6 milhão de pessoas. Entre 2010 e 2022, período em que o novo censo foi publicado, esse número dobrou.
Os especialistas explicam que esse índice é impulsionado pelas altas temperaturas. Uma das consequências do calor é a alteração no ciclo hidrológico. O principal problema está na evapotranspiração, que é a perda de água do solo.
🌧️ A evapotranspiração é o processo pelo qual a água da superfície terrestre passa para a atmosfera. Durante esse ciclo, a água presente em rios, lagos, represas, no solo e na vegetação evapora e retorna ao ar.
🌧️ Com a superfície mais quente, esse processo se intensifica. Ou seja, há mais perda de água da superfície e, consequentemente, menos água disponível.
Segundo o levantamento do g1, os estados mais afetados pelo calor extremo foram Alagoas, Ceará e Maranhão.
🔥 No Ceará, uma pesquisa recente da Fundação Cearense de Meteorologia (Funceme) mostrou que, nos últimos 60 anos, a temperatura no estado aumentou 1,8°C – um valor superior, por exemplo, à média global de 2024.
Além disso, pesquisadores identificaram, pela primeira vez, a existência de um clima árido no Brasil, semelhante ao de desertos. Essa área cobre quase 6 mil km² no centro-norte da Bahia. Na região, as cidades enfrentaram meses com temperaturas acima de 39°C.
Cidade no Nordeste foi classificada como de clima árido
Arquivo pessoal
Maior planície alagável do mundo em chamas
O Pantanal é considerado um dos mais importantes berços de biodiversidade do planeta e a maior planície alagável do mundo. Banhado pelo rio Paraguai, mais da metade do território fica submersa durante a época de cheias.
Em 2024, no entanto, o rio Paraguai atingiu seu pior nível em mais de cem anos. A seca, que já castigava o bioma, se tornou combustível para o fogo, intensificado pela ação humana.
O Pantanal enfrentou o pior incêndio em 20 anos, com milhares de hectares queimados. O que antes era um berço de diversidade se transformou em um cemitério a céu aberto. Muitos animais não conseguiram fugir das chamas e foram consumidos. (Veja imagem abaixo).
🔥 Depois do Norte, o Centro-Oeste foi a região que mais sofreu com a estiagem. Algumas cidades chegaram a enfrentar mais de quatro meses sem uma gota de chuva, o que levou várias delas a decretar situação de emergência.
Nesse cenário, o calor foi um fator agravante e alimentou a crise. Segundo os dados, o Centro-Oeste registrou as temperaturas mais altas do país, com cidades que ultrapassaram os 43°C – muito acima das máximas históricas, que giravam em torno de 31°C.
Sudeste em chamas
O fogo, a fumaça e a dengue marcaram o Sudeste em 2024. No estado de São Paulo, segundo o monitoramento do Inpe, os focos de incêndio cresceram mais de 400% em relação ao ano anterior. O fogo ainda é amplamente utilizado na área rural, e a estiagem, que ressecou as plantações, fez com que as chamas se espalhassem pelo estado.
O auge da crise ocorreu em agosto, quando o estado viveu um “dia do fogo”. Entre os dias 22 e 24 de agosto, foram registrados 2,6 mil focos de incêndio em diversas cidades. As chamas avançaram sobre rodovias, plantações, parques e casas.
Fogo destrói 300 mil pés de café no interior de São Paulo
Reprodução/TV Globo
Após a crise, algumas pessoas chegaram a ser presas por envolvimento em incêndios criminosos. O Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipan) analisou os dados e observou que a maior parte dos focos ocorreu em áreas agrícolas, com um intervalo médio de 90 minutos entre eles. (Leia mais aqui).
O fogo gerou uma densa camada de fumaça que cobriu a capital e outras cidades, deixando o céu acinzentado por dias. (Veja a imagem abaixo)
Fumaça em São Paulo após a crise do fogo
Joel Silva/Reuters
As chamas também avançaram sobre Minas Gerais, mobilizando dezenas de brigadistas para conter o fogo. O estado registrou um aumento de mais de 50% no número de incêndios.
O calor também representou um risco para a dengue. No Sudeste, os quatro estados ficaram entre os que tiveram os maiores índices da doença no país, com destaque para São Paulo. Foram quase dois milhões de casos, dos seis milhões registrados em todo o Brasil.
Funcionários do centro de controle de zoonoses realizam uma ação de combate ao mosquito Aedes aegypti em São Paulo
Bianca Canada/Estadão Conteúdo
No Rio de Janeiro, as temperaturas chegaram a níveis extremos, ultrapassando os 40°C e gerando alertas de risco à saúde. Uma pesquisa recente mostrou que o estado registrou picos de mortalidade durante seus dias mais quentes, incluindo 2024.
No Espírito Santo, a estiagem fez com que o Rio Cricaré deixasse de ser doce. A vazão baixou tanto que, em vez de o rio desaguar no mar, foi o mar que avançou sobre o rio. Como resultado, a água nas torneiras de moradores de três cidades ficou salgada.
Água das torneiras fica salgada em três cidades do ES
Rio Grande do Sul embaixo d’água
O Rio Grande do Sul também foi afetado pelo calor. O estado enfrentou a pior enchente de sua história, que deixou cidades devastadas e dezenas de mortos.
O Rio Grande do Sul enfrentou a maior enchente da história
Reprodução/TV Globo
Segundo especialistas, as temperaturas mais altas dos oceanos, causadas pelas mudanças climáticas, têm impacto direto nas chuvas que o estado experimentou – e que têm se repetido em várias partes do país.
O oceano mais quente coloca mais umidade na atmosfera, que se transforma em combustível para as tempestades, resultando em chuvas com volumes nunca antes vistos.
No caso do Rio Grande do Sul, o lago Guaíba recebeu 14,2 trilhões de litros de água entre 1º e 7 de maio, período em que ocorreram as enchentes. Esse volume é quase metade da capacidade do reservatório da usina de Itaipu, a segunda maior hidrelétrica geradora de energia do mundo.