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Aposentada está proibida de frequentar ‘lugares que induzam à prática de atos ilícitos’. UPA do Jardim Guanabara, em Presidente Prudente (SP)
Arquivo/g1
A Justiça determinou uma série de medidas cautelares que deverão ser cumpridas pela aposentada, de 66 anos, que havia sido presa em flagrante por crime de racismo, suspeita de ter chamado uma enfermeira de “negrinha pilantra”, nesta terça-feira (18), na Unidade de Pronto Atendimento (UPA) do Jardim Guanabara, na zona norte, em Presidente Prudente (SP).
Segundo o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJ-SP) informou ao g1, o Poder Judiciário concedeu liberdade provisória sem fiança à mulher, durante a audiência de custódia realizada no mesmo dia da prisão, com a imposição das seguintes medidas cautelares:
obrigação de comparecimento mensal no Fórum de seu domicílio para justificar suas atividades;
proibição de se ausentar da comarca de seu domicílio por período superior a oito dias sem prévia autorização judicial; e
proibição de frequentar determinados locais, “tais como bares , boates, casas de reputação duvidosa, de jogos de azar, ou quaisquer outros lugares que induzam à prática de atos ilícitos”.
“O inquérito policial segue em andamento, porém os autos tramitam sob sigilo, conforme disposto no artigo 20 do Código de Processo Penal, portanto as informações e documentos nos autos são de acesso restrito às partes e advogados”, salientou o TJ-SP ao g1.
A legislação citada prevê que “a autoridade assegurará no inquérito o sigilo necessário à elucidação do fato ou exigido pelo interesse da sociedade”.
O caso
Uma mulher, de 66 anos, foi presa em flagrante por crime de racismo, na madrugada desta terça-feira, na UPA do Jardim Guanabara, em Presidente Prudente.
Segundo as informações do Boletim de Ocorrência registrado na Delegacia Participativa da Polícia Civil, a suspeita teria chamado uma enfermeira que trabalha no local de “negrinha pilantra”.
Em audiência de custódia, a Justiça decidiu conceder liberdade provisória à envolvida.
Suspeita de dengue
De acordo com o Boletim de Ocorrência, a mulher estava com suspeita de dengue na UPA à espera de atendimento para saber o resultado de exame, quando teria se envolvido em uma confusão com uma enfermeira, de 50 anos, por reclamar da demora na prestação do serviço.
No entanto, ainda conforme o registro policial, uma outra enfermeira, de 31 anos, na tentativa de apaziguar os ânimos, teria sido chamada de “negrinha pilantra”, quando pediu para que a paciente saísse da sala de acesso restrito onde estava.
A versão apresentada pela vítima foi confirmada por duas testemunhas, ou seja, um porteiro, de 35 anos, e a outra enfermeira, de 50 anos.
A aposentada negou a ofensa e disse apenas que havia se referido à enfermeira como “moreninha”.
As duas irmãs da paciente, que a acompanhavam no local, também negaram que a mulher tivesse ofendido a vítima.
Policiais militares foram acionados para comparecer à UPA e levaram a idosa à Delegacia Participativa da Polícia Civil, onde ela foi presa em flagrante pelo crime previsto no artigo 2º-A, da lei federal 7.716/89, que define os delitos resultantes de preconceito de raça ou de cor. Em caso de condenação, a pena prevista é de reclusão, de dois a cinco anos, e multa.
Na audiência de custódia, a Justiça decidiu colocar a mulher em liberdade provisória, mediante o cumprimento de medidas cautelares.
Gritaria
Em depoimento prestado à Polícia Civil, a vítima contou que trabalha no pré-atendimento em triagem dos pacientes antes de passarem pela consulta médica na UPA. Ela disse que escutou uma gritaria que vinha da sala ao lado, onde atua outra enfermeira, e foi ao local para saber o que ocorria.
Na sala, estavam a paciente, acompanhada de duas irmãs, e ainda a enfermeira e um porteiro.
Assim que tomou conhecimento de que a paciente reclamava da demora em ser atendida e de que outras pessoas haviam passado à sua frente, na tentativa de apaziguar a situação para voltarem a trabalhar, a vítima disse que explicou à mulher que dois doentes mais graves tinham tido, naquele momento, prioridade no atendimento.
Como a idosa não queria aceitar a explicação, foi-lhe pedido para que voltasse ao rol de espera, já que tanto ela como suas irmãs tinham “invadido” a sala da enfermeira, que se trata de local de acesso restrito a pacientes previamente anunciados.
Nesse instante, segundo o Boletim de Ocorrência, a aposentada teria proferido o seguinte xingamento à vítima: “Sua negrinha pilantra”.
‘Moreninha’
Também em depoimento prestado à Polícia Civil, a idosa negou que tivesse ofendido a funcionária da UPA.
Ela relatou que estava com sintomas de dengue e, na segunda-feira (17), no período da tarde, havia passado pela unidade e realizado exame, mas tinha sido liberada por uma médica para aguardar o resultado em casa.
A idosa citou que não estava se sentindo bem e retornou à noite com suas irmãs à UPA, onde realizou a triagem.
A mulher disse que, cansada e passando mal pela demora, foi questionar a funcionária da triagem, quando apareceu outra enfermeira e tiveram uma discussão acerca do tempo de espera.
Ainda segundo o Boletim de Ocorrência, a idosa alegou que “apenas” se referiu à enfermeira como “moreninha” e não como “negrinha pilantra”.
Ciop
O g1 solicitou um posicionamento oficial do Consórcio Intermunicipal do Oeste Paulista (Ciop) sobre o assunto, mas o organismo responsável pela administração da UPA preferiu não se manifestar.