‘STF teve que esperar um filme fazer sucesso para desengavetar ações sobre a lei da Anistia’, diz Marcelo Rubens Paiva em evento na USP pela Democracia


Fala ocorreu neste sábado (15) durante celebração dos 40 anos da redemocratização do Brasil. Caso do deputado Rubens Paiva foi retratado no filme “Ainda Estou Aqui” e depende do STF para voltar a ser discutido judicialmente. Ministra Cármen Lúcia, jornalista Patrícia Campos Mello e o escritor Marcelo Rubens Paiva em evento na USP
Reprodução/GloboNews
O escritor e jornalista Marcelo Rubens Paiva criticou a demora do Supremo Tribunal Federal (STF) em dar andamento a processos que questionam a aplicação da Lei da Anistia para crimes cometidos durante a ditadura militar que permanecem sem solução — como o assassinato de seu pai, o deputado Rubens Paiva, cuja história foi retratada no filme “Ainda Estou Aqui”.
Uma lei que foi aprovada no regime Figueiredo, num congresso engessado, por senadores biônicos, sem oposição, porque a oposição estava no exílio. Então, como essa lei ainda está em julgamento em 2025? Isso me envergonha […] Eu não entendo por que o supremo teve que esperar um filme fazer sucesso para desengavetar essa lei, é algo que me foge a lógica
A fala ocorreu neste sábado (15), num evento da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP) que celebrou os 40 anos da redemocratização do Brasil (entenda mais abaixo). Além de Marcelo, também estava presente a ministra Cármen Lúcia, do STF, para quem ele se voltou no momento da crítica.
Em 21 de fevereiro, cerca de um mês após o longa-metragem receber três indicações ao Oscar®, o Supremo votou por analisar se dará continuidade aos processos que apuram as circunstâncias da morte de Rubens Paiva e de outras duas vítimas da ditadura.
Cinco militares são acusados de envolvimento no assassinato do deputado, sendo que três já morreram, sem sofrerem nenhuma condenação no caso.
Em resumo, um processo foi aberto contra o grupo na Justiça Federal do Rio de Janeiro, mas a defesa dos acusados recorreu às instâncias superiores para encerrar a ação, com base na Lei de Anistia, o que foi acatado.
🔎 Sancionada em 1979, a Lei da Anistia extinguiu a punição para crimes políticos e delitos relacionados praticados entre 1961 e 15 de agosto de 1979. Seus defensores argumentam que ela foi necessária para “pacificar o país” e pavimentar o caminho que levaria ao fim da ditadura militar.
Os três processos discutem a aplicação da lei sob os seguintes aspectos:
se a anistia pode ocorrer nos casos de crimes permanentes, ou seja, aqueles consumados por dias, meses ou até anos, como sequestro e ocultação de cadáver. Neste tipo de delito, a ação se prolonga e vai além do período coberto pela lei em discussão;
se legislação é compatível com tratados internacionais aos quais o Brasil se comprometeu a cumprir, como o Pacto de São José da Costa Rica, que trata de direitos humanos.
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40 anos da redemocratização
Em 15 de março de 1985, o maranhense José Sarney tomou posse como presidente interino do Brasil, sendo o primeiro civil a ocupar o cargo de chefe do Executivo brasileiro após 21 anos de ditadura militar — um marco na redemocratização do país.
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A volta da democracia foi um processo cauteloso, que exigiu negociações entre as elites política e militar do país. A abertura “lenta e gradual” teve início no governo do general Ernesto Geisel (1974-1979) e prosseguiu com o general João Baptista Figueiredo (1979-1985), ambos do Exército Brasileiro.
Um dos reflexos da busca da sociedade civil pela democracia foi a campanha das “Diretas Já” para aprovar no Congresso a chamada emenda Dante de Oliveira, que modificava a Constituição e determinava a volta da eleição para presidente pelo voto direto dos brasileiros.
Em 1984, apesar da emenda não ter sido aprovada, a mobilização nas ruas reforçou o sentimento de que a ditadura se aproximava do fim. A eleição do novo presidente foi realizada no colégio eleitoral, com os votos de deputados e senadores, em 15 de janeiro.
Político de perfil conciliador e candidato da oposição, o ex-governador de Minas Gerais Tancredo Neves costurou um acordo político denominado de Aliança Democrática incluindo seu partido, o Movimento Democrático Brasileiro (MDB), outras siglas de oposição e políticos da Frente Liberal, que depois veio a se tornar o Partido da Frente Liberal (PFL). Tratava-se de uma dissidência do Partido Democrático Social (PDS), partido que sucedeu a Arena no apoio ao regime militar.
Tancredo acabou superando o candidato governista Paulo Maluf (PDS) na eleição do colégio eleitoral. A vitória gerou a expectativa de grandes mudanças no país, cuja população sofria com a inflação acima de 200% ao ano. Sua posse seria o ponto inicial da Nova República — como ficou conhecida na época a volta do poder a um presidente civil.
Contudo, o presidente eleito foi hospitalizado na véspera da posse com fortes dores abdominais e precisou passar por uma cirurgia. Então, quem assumiu a responsabilidade de dar posse aos novos ministros foi seu vice, José Sarney.
Ex-presidente do PDS, Sarney era senador pelo Maranhão, já havia sido governador do mesmo estado e deixou a legenda para se filiar ao MDB, partido pelo qual concorreu como vice de Tancredo.
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