Policias Eduardo de Freitas Araújo e Augusto Vinícius Santos de Oliveira foram acusados pela morte de Rogério de Andrade Jesus durante uma ação em Guarujá (SP). Câmera no corpo de PM filma suposta execução durante a Operação Escudo
Dois policiais militares que viraram réus por homicídio durante a Operação Escudo vão a júri popular. A data para o julgamento dos agentes Eduardo de Freitas Araújo e Augusto Vinícius Santos de Oliveira, no entanto, ainda não foi marcada. Os PMs são acusados de matar Rogério de Andrade Jesus durante a ação realizada na Baixada Santista que deixou 28 mortos em 2023. Ainda cabe recurso.
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A Operação Escudo começou em julho de 2023 após o assassinato do PM das Rondas Ostensivas Tobias de Aguiar (Rota) Patrick Bastos Reis, em Guarujá (SP). Durante 40 dias de ação, 28 pessoas morreram em supostos confrontos com policiais no litoral paulista.
A denúncia do Ministério Público do Estado de São Paulo (MP-SP), que foi acatada pela Justiça de Guarujá em dezembro, cita que Eduardo apontou o fuzil para o interior da casa de Rogério e disparou contra ele, enquanto Augusto obstruiu a câmera corporal.
Nas imagens obtidas pela equipe de reportagem é possível ver a cena que, de acordo com o MP-SP, mostram a execução de Rogério. O caso aconteceu na manhã de 30 de julho, no Morro do Macaco, também em Guarujá.
PMs vão a júri popular por homicídio durante a Operação Escudo em Guarujá (SP)
Reprodução/MP-SP
Os primeiros que vão a júri
De acordo com o artigo 413 do Código de Processo Penal, a Justiça deve pronunciar o acusado, ou seja, submetê-lo a júri popular, quando estiver convencida da materialidade do crime e da existência de indícios suficientes de autoria ou participação, o que aconteceu na última segunda-feira (9).
Eduardo e Augusto foram os primeiros policiais militares réus da Operação Escudo a receber uma sentença de pronúncia. Além deles, outros seis agentes também foram acusados de homicídio na mesma operação.
A execução, segundo o MP-SP
Casa onde Rogério de Andrade Jesus teria sido morto em Guarujá (SP)
Reprodução/MP-SP
A equipe de policiais militares avançou pela comunidade e, por volta das 7h42, identificou uma movimentação de pessoas;
No local, o policial Eduardo de Freitas Araújo conversou com um homem, que informou ao agente desconhecer o morador da casa vizinha, ocupada naquele momento por Rogério de Andrade Araújo;
O MP-SP relatou que o policial Eduardo foi até a casa onde estava Rogério Andrade Araújo, onde ficou por aproximadamente um minuto tentando, sem sucesso, ver o que havia dentro. Para isso, ele puxou a janela com a mão;
Em seguida, o policial se colocou ao lado da porta da casa do homem, enquanto o policial Augusto se posicionou atrás dele;
Os outros integrantes, Vitor Nigro Vendetti Pereira e José Pedro Ferraz Rodrigues Junior, segundo o MP-SP, ficaram na retaguarda, com suas câmeras operacionais desobstruídas, “não havendo, uma vez mais, visualização de qualquer ato suspeito”;
Por volta das 07h45, o policial Eduardo abriu a porta da casa de Rogério Andrade Araújo e, em seguida, posicionou o fuzil para o interior do imóvel;
Passados aproximadamente 28 segundos, o policial Eduardo efetuou um disparo de fuzil que, segundo o MP-SP, atingiu a região torácica anterior da vítima, causando a morte dela.
Provas ‘plantadas’, segundo o MP-SP
PMs se tornaram réus por homicídio durante a Operação Escudo
Reprodução/MP-SP
Feito o disparo, o policial Eduardo entrou na casa, colocando-se na posição lateral, de modo que a câmera corporal não captasse as imagens de Rogério e, ainda segundo o MP-SP, filmasse a inexistência da pistola atribuída ao ofendido;
Segundo depois, o policial Augusto, com a câmera já obstruída, também entrou na casa. De acordo com o órgão, ele tinha o “objetivo de alterar a cena dos fatos”;
Segundo o MP-SP, Augusto simulou ter apreendido a pistola supostamente usada por Rogério;
O órgão apontou também que o policial Eduardo, ainda evitando posicionar a câmera na direção da vítima, colocou um objeto sobre o armário, ação que teria sido captada pela sombra projetada na parede;
Eduardo teria, já com a câmera desobstruída, caminhado em direção ao armário onde momentos antes deixou o objeto, recolhendo um colete balístico que, segundo o MP-SP, foi atribuído também como propriedade da vítima;
O MP-SP apurou que, antes do caso, tal colete foi levado ao Morro do Macaco, de forma oculta, com o objetivo de ser “plantado” na cena de um eventual confronto policial, como teria sido registrado também na câmera corporal de um agente;
Eduardo teria escondido o colete balístico debaixo da capa da Rota dele, o que “causou um aumento de volume nas costas, fato que evidenciou não se tratar do seu equipamento padrão”, ainda segundo o MP-SP.
A versão da PM
Ministério Público aponta que colete apreendido no local foi levado por policiais
Reprodução/MP-SP
Os quatro PMs envolvidos na ação que culminou com a morte de Rogério usavam câmeras em seus uniformes, informação que consta nos depoimentos concedidos ao delegado Otaviano Toshiaki Uwada.
De acordo com a versão apresentada pelos PMs na delegacia de Guarujá, quatro agentes faziam patrulhamento na região quando a população passou a apontar para um morro. Eles decidiram descer da viatura para verificar o que acontecia.
Os policiais relataram que as pessoas apontavam para uma casa, mas sem dizer quem morava nela. O local estava entreaberto, segundo os depoimentos dos policiais, e “pela porta já viu um indivíduo armado com uma pistola”.
A versão oficial indica que os PMs deram voz para a pessoa largar a arma, mas a pessoa não teria obedecido. O homem, identificado como Rogério de Andrade de Jesus, de 50 anos, teria apontado uma pistola 380 na direção da equipe.
MP concluiu análise das imagens das câmeras
MP-SP alega que pistola foi ‘plantada’ por equipe policial onde o homem foi morto
Reprodução/MP-SP
O MP-SP concluiu a análise das imagens das câmeras corporais usadas pelos policiais militares durante a operação no litoral paulista. As autoridades do estado afirma que todas as mortes foram de suspeitos que entraram em confronto com os policiais.
Os promotores tiveram acesso a mais de 50 horas de gravação. Com base no material, concluíram que:
Em três ocorrências, houve confrontos com criminosos;
Em duas ocorrências, as gravações não captaram os momentos das supostas trocas de tiros, mas, segundo o MP, são importantes porque revelam falhas operacionais, como câmeras descarregadas e o não acionamento do modo de gravação em alta qualidade e com som durante as incursões.
Os promotores consideram que, em uma das ocorrências, as imagens não trazem nenhuma informação relevante para a investigação.
Só foi possível analisar 6 das 16 mortes por intervenção policial registradas entre os dias 28 de julho e 1º de agosto nas cidades de Santos e Guarujá. A Polícia Militar informou ao MP que não existem imagens das ações que resultaram nas outras 10 mortes, seja porque o batalhão ainda não dispõe do equipamento ou porque estavam inoperantes.
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