Relator, Moraes vota por análise no STF do caso Rubens Paiva e de outras duas vítimas da ditadura; julgamento continua

Supremo começa a decidir nesta sexta se julgamento vai prosseguir e se terá ‘repercussão geral’, ou seja, guiará outros processos. Ações questionam se Lei de Anistia se aplica às violações de direitos humanos. Fernanda Vivas
O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal, votou nesta sexta-feira (14) a favor de que a Corte julgue se deve prosseguir o processo que apura as circunstâncias da morte do ex-deputado Rubens Paiva e os casos de outros duas vítimas da ditadura militar.
Neste primeiro momento, Moraes votou pela aplicação do sistema de repercussão geral aos três processos.
Por este mecanismo, os ministros decidem uma questão e elaboram uma tese a ser usada em todos os processos com o mesmo tema nas instâncias inferiores, uniformizando o entendimento da Justiça. A definição da tese será em um segundo momento, em outro julgamento.
O caso de Rubens Paiva foi retratado no filme “Ainda estou aqui”, que concorre ao Oscar. Deputado cassado na ditadura, Paiva foi morto em janeiro de 1971.
Moraes propõe a análise do tema junto com outros dois processos:
– o desaparecimento de Mário Alves de Souza Vieira, um dos fundadores do Partido Comunista Brasileiro Revolucionário (PCBR). Sequestrado em janeiro de 1970, nunca teve o corpo encontrado.
– a morte de Helder José Gomes Goulart, que teve ossada encontrada no Cemitério de Perus, em São Paulo, em 1992. Em 1973, legistas omitiram as reais circunstâncias de sua morte, decorrente da ação de militares.
Tema
Os três processos discutem a aplicação da Lei de Anistia sob os seguintes aspectos:
se a anistia pode ocorrer no casos de crimes permanentes, ou seja, que ainda estão em execução. Neste tipo de delito, a ação se prolonga no tempo e vai além do período coberto pela legislação em discussão;
se a Lei da Anistia é compatível com tratados internacionais aos quais o Brasil se comprometeu a cumprir, como o Pacto de São José da Costa Rica, que trata de direitos humanos.
O Brasil tem sido alvo de condenações internacionais pela falta de punição a crimes comuns cometidos na ditadura.
O país já foi responsabilizado pela Corte Interamericana de Direitos Humanos, por exemplo, em casos envolvendo a Guerrilha do Araguaia e a morte de Vladimir Herzog.
Quando validou a Lei de Anistia, o Supremo analisou o tema diante das regras brasileiras. Agora, a questão envolve avaliar se ela é compatível com o acordo internacional ao qual o Brasil aderiu.
Voto do relator
Ao apresentar seu voto, Moraes ressaltou a importância da discussão do tema.
“Os presentes casos tangenciam matéria de grande relevância para a pauta dos direitos humanos, permitindo que agora o Supremo Tribunal Federal avalie a questão a partir da perspectiva de casos concretos, com diferentes nuances. Portanto, na presente hipótese é patente a repercussão geral”, argumentou.
‘Efetivamente, o tema controvertido é portador de ampla repercussão e de suma importância para o cenário político, social e jurídico e a matéria não interessa única e simplesmente às partes envolvidas na lide. Por essas razões, manifesto-me pelo reconhecimento da repercussão geral da matéria constitucional”, disse.
O relator ressaltou que, além das duas condenações internacionais aplicadas ao Brasil, a Corte Interamericana de Direitos Humanos analisa um terceiro caso relativo à ditadura, que pode voltar a responsabilizar o país por se omitir diante de violações de direitos humanos.
“Isso demonstra a atualidade do debate sobre a vigência da Lei 6.683/1979, numa ordem constitucional que preza de modo intransigente pelo respeito aos direitos humanos. Em outros países, também se verificou o debate sobre a legitimidade de norma que concedeu anistia, de modo a beneficiar não apenas os punidos pela ordem ditatorial, mas também os agentes públicos que cometeram crimes comuns, a pretexto de combater os dissidentes”, declarou.
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